30.5.07

UM BARCO POR MORRER, UM PAÍS POR NASCER

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A jangada de S. Vicente agoniza entre a ferrugem e as marés que a fazem boiar rente à superfície, qual náufrago apenas com a cabeça de fora. São mais os dias em que está parada, que aqueles em que se arroja entre as duas margens. O impacto económico para o país, que importa grande parte dos bens a partir do Senegal, imagina-se gigantesco. O impacto para as populações, esse, é dramático. Em Suzana, por exemplo, as produtoras hortícolas afirmam não conseguir escoar a sua produção pelo segundo ano consecutivo (no ano passado foi a guerra), pois as "bideiras" de Bissau não se deslocam à região para comprar legumes e hortaliças.

Quem passa por S. Vicente pergunta como pode o barco que liga o norte ao centro e sul do país estar naquele estado. A estupefacção é ainda maior quando as receitas amealhadas mensalmente com a travessia de viaturas são, diz-se, muito razoáveis, o que permitiria pagar a manutenção do "engenho".

Passo por ali muitas vezes e costumo brincar com a simpática tripulação, dizendo que qualquer dia vamos passear ao mar na “geringonça”. Eles riem-se, ingénuos e impotentes. A jangada não tem coletes salva-vidas, embora transporte pessoas, não tem luzes, embora circule à noite, não tem âncora, para travar uma viagem ao sabor da corrente em caso de emergência, não tem leme... Dos dois motores, apenas um labuta, a 20% da capacidade, mais cansado que um nadador após os 400 metros mariposa. Doente e moribunda, a jangada é a imagem da Guiné-Bissau: flutua como que por milagre, à espera de uma intervenção que a faça reviver ou de um abanão que a faça afundar de vez.

Em 2002, o barco que ligava a Casamança a Dacar, o Djola, mergulhou silencioso no fundo do Atlântico. Morreram cerca de 2000 pessoas. O acidente abriu a pestana aos dirigentes senegaleses instalados no conforto do poder. O Djola, principal meio de ligação do sul com o centro e norte do Senegal marcou um ponto de viragem no conflito da Casamança. A população, impedida de viajar por terra, devido à guerra, disse basta e optou pela paz. Dacar aproveitou a oportunidade. A partir daí o MFDC (movimento independentista) perdeu capacidade de manobra e o apoio dos casamancences, que escolheram definitivamente o Senegal como a sua pátria.

Esperemos que a jangada de S. Vicente não venha a chamar-se nunca "Djola". Os habitantes do norte da Guiné-Bissau terão então motivos para reclamar um novo país.

1 comentário:

Anónimo disse...

Haja deus!!!
Pelos vistos em breve teremos PONTE NOVA...
http://psvicente.blogspot.com/
E eu que tanto gostava de levar a minha casa volante a Bissau... e voltar...
Parabéns pelo blog.
Antonio Resende