22.2.08

O ARRUMADOR-FILÓSOFO

Commando (lê-se cômandô) é a antítese do arrumador. Não pede dinheiro, sabe conversar, não bebe, não fuma e não se droga. Este habitué do parque de estacionamento de uma esplanada de Bamako é alto, corpulento, largo e veste de preto. No entanto falta-lhe algo que faça dele um verdadeiro Commando. Apesar do nome a sua postura aproxima-se mais de um filósofo espontâneo, que de um (suposto) militar arrumador de automóveis.

Tornámo-nos amigos na primeira vez que estacionei na área de que é rei e senhor há mais de 10 anos. Abriu a porta do carro, cumprimentou e, vendo-me novo naquelas paragens e sozinho, desfiou de seguida o cartel de serviços que tem para oferecer: guarda do carro, lavagem executada na hora por um dos seus “funcionários” e as meninas mais bonitas de Bamako.

Até hoje fiquei-me pela guarda do carro, não me podendo por isso pronunciar quanto aos restantes serviços disponibilizados pelo Commando. Mas a verdadeira razão que me leva a falar deste sujeito é a frase que remata de cada vez que as moedas me rareiam na carteira, na hora de regressar a casa.

Commando fecha a porta do carro com o mesmo sorriso e bondade de todos os dias e exclama, com o ar mais natural do mundo:

- On ne peut pas gagner tous les jours, mon ami.

A máxima do Commando acompanha-me desde que lha ouvi dizer. Nos dias em que a vida corre mal, em que os problemas nos derrotam e nos deitam ao chão, fecho a porta que impede as correntes de ar de chegar ao cérebro e, com um sorriso igual ao do Commando, penso: de facto não se pode ganhar todos os dias.

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